quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Nina Simone



No passado sábado tive mais um momento especial, a juntar a tantos outros que este blogue me tem proporcionado. 

Rodeada de vinis, bons amigos e muita música, num ambiente acolhedor e intimista com sabor a vinho tinto a acompanhar, senti-me confortável o suficiente para não me deixar intimidar pelo nervoso miudinho que sentia até aquele preciso momento.
Foi bom, mais uma vez, poder “espalhar a mensagem”, dar a conhecer esta música que tem a sua origem num passado não muito longínquo, mas que poucos conhecem actualmente. 

Mais do que a música em si, foi importante dar a conhecer também a sua história, o seu papel ao longo dos anos, as vozes que lhe deram ‘alma’, a sua essência e o seu como, quando e porquê.

Foi igualmente bom, para mim, todo o processo até lá, toda aprendizagem e as pequenas e novas descobertas que fiz pelo caminho. É que embora muita gente me diga que eu sei muito, eu sinto que não sei quase nada. Contudo, não é um sentimento que me assuste, antes pelo contrário, é algo que eu adoro na música – a capacidade de aprender e descobrir coisas novas, sejam do presente ou do passado, todos os dias.

Uma das vozes mais acarinhadas da noite foi a da minha querida Nina Simone
Ela, que eu tanto admiro e que me tem acompanhado tantos dias e tantas noites ao longo da minha vida. 
Ela, que foi fonte de inspiração para toda uma geração, seja pelo seu talento ou pela sua determinação.
Ela, uma personalidade forte, cheia de garra e de amor pela música e pelos seus ideais. 

Assim sendo, por tudo isto, achei que seria um bom momento para lhe dedicar um post no Groove your Soul! Esta noite ela e os seus discos estarão comigo mais uma vez. 

Querem acompanhar-nos?

   
Eunice Kathleen Waymon nasceu em 1933, na Carolina do Norte (E.U.A.). Aos 3 anos já tocava piano, tornando-se na pequena estrela da igreja local na qual actuava. Devido ao seu talento obteve fundos da comunidade bem como, dos senhorios da casa em que a sua mãe era governanta, possibilitando-lhe, assim, ter aulas de música.

Após acabar o liceu, e com o objectivo de tornar-se pianista de música clássica, prestou uma audição na prestigiada escola música, Curtis Institute, na Filadélfia, mas foi recusada por, segundo soube posteriormente, ser negra. Um dos muitos gestos de preconceito que viria a enfrentar ao longo da sua vida, contribuindo para torná-la numa das cantoras mais activistas do seu tempo. Mas já aí vamos. Mais tarde, nos anos 50, mudou-se para Nova Iorque e ingressou na Juilliard School of Music. Ao mesmo tempo e por forma a aperfeiçoar a sua performance, actuava em bares e clubes jazz nos quais lhe era solicitado que também cantasse ao piano. Nestas actuações, embora cantando jazz, blues, gospel e soul, Nina procurou sempre injectar uma dose de música clássica nos seus temas pois, segundo ela, dava-lhes mais qualidade.

Nessa altura adoptou o nome artístico de Nina Simone. Nina de “niña” (pequena em espanhol), como o seu namorado então lhe chamava, e Simone em homenagem a uma das suas actrizes favoritas, a francesa Simone Signoret.
Em 1958, inspirada por Billie Holiday, gravou aquele que viria a ser o seu primeiro sucesso - “I Loves You, Porgy”, do seu primeiro álbum – “Little Girl Blue”.



No mesmo álbum podemos ainda encontrar os temas “My Baby Just Cares For Me”, “Moon Indigo” e “Love Me Or Leave Me”.


 




Para quem ainda não percebeu, este post vai ser longo. 
Sempre tive algum “receio” de escrever sobre Nina Simone, pois ela, tal como outros gigantes da música para mim, não cabe num simples post. Dá-me vontade de escrever um livro, com um capítulo generoso dedicado a cada um. O mesmo acontece com as suas músicas. São muitas as que merecem ser destacadas, apreciadas, ouvidas com calma. Seria injusto escolher apenas dez, por exemplo. Vinte, talvez, com boa vontade… Por isso, o meu conselho é - saboreiem também com calma este post.






As duas canções que acabaram de ouvir pertencem ao primeiro vinil que comprei de Nina Simone, “Nina Simone at Town All”. O mesmo foi gravado ao vivo em 1959 e, ao juntar-lhe os temas “The Other Woman”, “Cotton-Eyed Joe” e “You Can Have Him”, torna-se num dos meus vinis preferidos de sempre e de Nina Simone.

Uns anos mais tarde, aquando da minha ida a Londres para ver o D’Angelo, viria a encontrar novamente estes dois temas, num vinil que viria igualmente para a minha lista de favoritos – “Wild Is The Wind” (1966).

Lembro-me perfeitamente de me sentir perdida naquela loja de Notting Hill, com pelo menos uma certeza de que no meio daqueles discos todos, eu sairia de lá com um de Nina Simone debaixo do braço. Depois dessa certeza, veio a indecisão de qual "Nina" regressaria comigo a Portugal. Eis que o vendedor da loja, bastante simpático e sábio por sinal, aconselhou-me a escolher o da capa vermelha. Assim foi. Dos 12 vinis que comprei em Londres, esse foi o primeiro que ouvi mal cheguei a casa. Quando acabei de ouvi-lo tive pena de não ter ficado com um contacto da loja, só para lhe poder dizer, do fundo do coração, “Obrigada!”.

Neste álbum conheci novos temas da cantora como “Lilac Wine” (e é engraçado como qualquer combinação entre a música de Nina Simone e o vinho, para mim, é perfeita!) e “Four Women”, outra música que me despertou a curiosidade e me levou a conhecer outra Nina, a Nina guerreira.



“Four Women”, uma música que representa quatro estereótipos de mulheres negras, vítimas numa época de escravatura. Uma das músicas que Nina compôs enquanto defensora activa dos direitos civis. A primeira foi “Mississippi Goddam”, em 1964, aquando do assassinato do activista, Medgar Evers, e do bombardeamento de uma igreja no Alabama que originou a morte de quatro crianças negras. 
Outros temas se seguiram como "I Wish I Knew How It Would Feel to Be Free” (1967) e “To Be Young, Gifted and Black” (1970), revelando o papel activista da cantora, que utilizava a sua música e a sua voz como forma de protesto pacífica. 




Nina Simone foi das artistas do seu tempo que mais apoiou o Movimento dos Direitos Civis Americano, cujo objectivo era atingir a igualdade entre brancos e negros, numa época onde a discriminação racial e a opressão social eram sentidas, literalmente, à flor da pele. Nina era igualmente uma defensora afinca do Black Power, movimento que também surgiu no final dos anos 60 e que visava enfatizar o orgulho racial na população negra, criando instituições políticas e intelectuais que defendessem e promovessem os seus interesses. Nina sentia que como figura pública que era, tinha como missão inspirar as gerações mais jovens, fazendo com que estas tivessem orgulho nas suas raízes e nos seus valores. 
A mesma assim nos explica no vídeo que se segue, that blackness...




São tantos e tão variados os álbuns que aqui vos poderia falar… Em tempos escrevi num dos meus posts que, ao ouvir cantar Nina Simone, sentia que o piano tinha sido inventado apenas para acompanhar a sua voz… Ainda hoje, por vezes, tenho esse sentimento. Nina, com apenas um piano, pode fazer de nós o que quiser... Esta senhora tanto nos canta Duke Ellington (“Nina Simone Sings Ellington” 1962), como nos encanta com Billie Holiday (“Sings Billie Holiday”, 1974), ou nos deixa melancólicos com o seu blues (“Nina Simone Sings the Blues”, 1967). Deste último também são muitos os temas que nos deixam no escuro, sem vontade de lá sair. Falo de, por exemplo, “Do I Move You?”, “In The Dark”, “I Want a Little Sugar in My Bowl”, “Since I Fell for You” ou este “Backlash Blues”.



Decidi mostrar-vos esta versão ao vivo em 1976, no festival de Montreal, para vos falar de como Nina era deliciosa em palco. Nina Simone era, de facto, uma diva! O seu talento, aliado à sua naturalidade e espontaneidade, resultavam num cocktail explosivo. Nina gostava de falar com o público, contar-lhe histórias, provocar-lhe. Era capaz de interromper uma música a meio, pelo motivo mais descabido, caso assim o entendesse. 
Deixo-vos agora mais um exemplo da sua impetuosidade e, no final deste post, encontrarão também disponível o vídeo do concerto completo, bem como, um documentário sobre a vida da cantora, caso vos interesse ver.



Mas são mais, muitos mais os temas que marcaram a carreira desta cantora... fiquem com alguns:

Don’t Let Me Be Misunderstood (1964)


I Put a Spell on You (1965)


Feelling Good (1965)


Ain’t Got No, I Got Life (1968)


 
E para fechar, uma das suas músicas mais grandiosas na minha opinião, “Sinnerman” (1965). Proveniente das suas origens do gospel e dos encontros metodistas da sua mãe, esta canção tira-nos o fôlego por dez minutos, com uma bateria frenética desde o inicio até o final, onde também se junta a guitarra, o contrabaixo e o piano, proporcionando-nos todo um festival de jazz, que entre o bater de palmas e a voz pecadora de Nina, culmina na exaustão. 




Sejam livres soul lovers e não se esqueçam, you can cage the singer, but not the song.





Concerto 1976 em Montreal:

 

Documentário Nina Simone:
 

6 comentários:

  1. All that class and you left out some dancefloors favourites, her answer to hit the road jack

    http://www.youtube.com/watch?v=P-l2IYTkTxk

    her version of save me (written by Aretha Franklin and her sister Carolyn)

    http://www.youtube.com/watch?v=5ZUlWsmeqr0



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    1. One of the things I've written in this post was: "although people say to me I know a lot, I feel I don't know anything at all. However, that feeling doesn't scares me, and it's something I love in music - the capacity of know and learn new things, from the present and from the past, every day."

      And that's why I love so much this blog.
      I didn't know these songs.

      Thank you very much for sharing, whoever you are :)

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  2. Beautiful things are there to be shared :)

    Nina Simone (to me) always brings a raw, visceral, often explicitly sexual edge that is poetic rather vulgar, something exceptional and therefore to be treasured.

    I'm sorry I missed your showcase in LX, I'm sure I would have liked it. Hopefully a next time soon...

    Kris

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    1. Totally agree!! :)

      Beautiful words about Nina...

      Kris, I'm curious... we are speaking in english but I write in portuguese... Do you understand portuguese? How did you discover my blog?

      Hoping it as well! The more soul lovers I meet, the happier I am.

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  3. A Nina Simone é a Maior!
    Como sempre, um texto com alma, minha baby soul sista. : )

    Helena

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