Há dias em que preciso estar comigo própria mais do que o habitual.
Dias em que preciso escutar-me, mimar-me, valorizar-me.
Nesses dias penso em coisas que me são especiais e em
momentos que também o foram.
A música, como é óbvio, acompanha-me neste processo.
Assim sendo, vou partilhar convosco um momento especial, que
recordo com especial alegria e com especial amor.
Let’s
cruise with me?
Bem, posto isto, vamos todos entrar em D mode??
Então vamos lá!
Existem cantores sobre os quais tenho medo de começar a
escrever, pois temo não conseguir parar! Este é um caso particularmente perigoso
para mim, como tal, não me responsabilizo pelo tamanho deste post, deixando já aqui o alerta!
D’Angelo é para mim… uma bomba! Dizer que me casava com ele
amanhã, se ele quisesse, é pouco! Histerismos à parte, a verdade é que,
se já falámos neste blogue da grande representante do neo-soul no
feminino (a nossa querida Badu), juntando-lhe o D’Angelo, aí sim, teríamos um
casamento perfeito!
D’Angelo transpira groove por todos os poros do seu corpo… a
sua voz, a forma como se move, como sente as suas músicas e como o transmite…
tudo isto é qualquer coisa de inexplicável para mim! Tudo nele é tão
terrivelmente smooth, sensual, doce… que entorpece-me os sentidos! Digo-o de
forma convicta, pois tive o privilégio de vê-lo actuar ao vivo e pude constatar
todo o seu talento, toda a sua magia e arrepiar-me a cada nota que saía da sua
boca e das suas mãos.
Mas antes de falarmos acerca da última vez que o vi, falemos
antes da primeira.
A imagem que retenho de D’Angelo como sendo a primeira vez
que o conheci, transporta-nos ao ano 2000, com o video que se segue.
“Pois… porque será??” - perguntam vocês. Sim, eu
sei, é de facto um vídeo... "intenso". Mas a verdade é que, se naquela altura este video impressionou-me pelos
motivos aparentes, anos mais tarde, quando verdadeiramente descobri
D’Angelo, o mesmo revelou-me exactamente o que esta música queria transmitir – entrega. Uma entrega total, de corpo e alma.
É esta mesma entrega que continuo a sentir entre D’Angelo e a sua música, que me continua a apaixonar.
Tanto esta canção como o seu video valeram a D’Angelo
uma enorme ovação por parte do público e da crítica. A canção (escrita em
parceria com o seu amigo Raphael Saadiq) foi concebida com o intuito de
prestar tributo a Prince (a maior inspiração de D’Angelo na sua carreira) e foi considerada pela revista Rolling Stone como o 4º melhor
single lançado no ano 2000. O video, pelo seu carácter arrojado,
ocupa ainda hoje o 44º lugar no Top da VH1 dos melhores videoclips de sempre.
E eu? ... Eu simplesmente venero esta canção.
Contudo, e embora "Untitled" seja uma das músicas que marcou a carreira de D'Angelo, foi com o groove fantástico de "Brown Sugar" que D se revelou como o grande pioneiro do neo-soul.
Michael Eugene
Archer (D’Angelo para os amigos) nasceu em 1974, nos EUA, e, além de cantar
maravilhosamente bem, também toca piano, guitarra, bateria e baixo. Todo ele equivale a uma banda completa!
Na década de 90 é descoberto pela editora EMI Records e em 1995 lança o seu primeiro álbum - "Brown Sugar", do qual é retirado o
primeiro single com o mesmo nome. Este álbum é excepcional! D pegou nas suas
raízes de gospel e soul tradicional, juntou-lhe o R&B contemporâneo e o hip hop e voilá! - Deu-nos o neo-soul! Parece simples, mas este álbum foi efectivamente
o grande impulsionador deste movimento, dando-lhe visibilidade comercial e
uma notoriedade para além fronteiras. Mais tarde, outros artistas viriam
perpetuar este estilo, como é o caso de Erykah Badu, Maxwell ou Lauryn Hill.
Mas voltemos ao
nosso brown sugar… Com este disco D’Angelo vendeu milhares de cópias,
tornando-se famoso e aclamado pela crítica. O álbum é extremamente romântico,
pois fala-nos de amor em praticamente todos os temas, muito ao estilo do soul
tradicional, incorporando sonoridades de modern jazz, hip hop e funk. Tal como
li numa crítica, trata-se de "a
blend of classic soul and urban attitude".
É difícil, para mim,
não falar de todas as canções do disco. Além de "Brown Sugar" e "Cruisin’" (cover
do original de Smokey Robinson), gosto muito de outros temas como "Jonz in My Bonz" e "Me
And Those Dreamin’ Eyes of Mine". Ambas possuem uma melodia suave e funky, que nos absorve por completo.
"Smooth" é, tal como o nome indica, outro tema suave do álbum, mas é o nasty "Shit, Damn, Motherfucker" que eu quero destacar. Só mesmo D para cantar-nos canções com títulos como este e,
ainda assim, soar a mel nos nossos ouvidos. Este tema fala-nos de traição (daí o
título) e tem um toque de blues que o torna extremamente sedutor e envolvente.
Por fim, "Lady", outro grande hit deste álbum, e "Higher", uma bonita balada que fecha
na perfeição o disco. Muitas são as comparações entre D’Angelo e Prince, devido
à similaridade das suas vozes e sonoridades. Nesta música, além das
semelhanças vocais, é também recordada a dicotomia espiritualidade/sexualidade explorada
por Prince nas suas letras.
Mas se gostaram de conhecer o primeiro álbum de D’Angelo,
então preparem-se para receber o segundo… Passaram-se 5 anos, mas eis que no ano 2000 ele surge melhor do que nunca, com este magnífico "Voodoo".
"Voodoo" é um álbum
mais maduro que, além do amor, aborda outros temas como espiritualidade e crescimento. As músicas deste álbum (à semelhança do anterior) foram compostas
e produzidas pelo próprio D’Angelo, com a ajuda valiosa de alguns amigos como Questlove,
Roy Hargrove, Angie Stone (então sua companheira) e, o já mencionado, Raphael Saadiq.
Quais as músicas que eu destaco deste álbum?
Todas.
(Eu avisei que este post seria longo!)
"Playa
Playa" abre maravilhosamente o disco, de forma muito
suave, ao sabor do jazz. Em "Devil's Pie" toma
lugar o hip hop, que se mantém em "Left
& Right" - o primeiro single a ser lançado. Um som muito funky, aliás, como é toda a base deste álbum, mas com
o hip hop a sobressair graças às colaborações dos rappers Method Man e Redman.
Entramos novamente em slow motion. Em "The Line", D fala-nos de forma introspectiva
sobre as suas "lutas internas" e em "Send It On" (um dos meus temas preferidos)
fala-nos da sua fé no amor, contando com a participação preciosa do trompetista, Roy
Hargrove.
Chegamos à música mais funky de todo o álbum, na minha opinião
- "Chicken Grease". Acreditem que ver
o groove de D’Angelo ao vivo, dançando ao ritmo desta música, é qualquer coisa de extraordinário...
Se, pelo contrário, quisermos ouvir algo para relaxar, então
recomendo "One Mo'Gin", "The
Root" e "Greatdayindamornin'".
Todas e cada uma destas músicas são excelentes para aqueles momentos em que apenas
queremos fechar os olhos e desconectar. A batida, o flow destas músicas, eleva-nos. Sentimo-nos
mais leves, acreditem.
Outra música particular do álbum é "Spanish Joint" - uma
fusão de instrumentos e sonoridades que misturam o R&B e a salsa, dando-nos um
ritmo quente e com toque latino, extremamente bem conseguido.
Tal como Lauryn Hill o fez no seu Miseducation, D também faz a sua vénia a Roberta Flack através do seu magnífico cover de "Feel Like Makin’ Love". Outro tema que se apodera de mim por
completo.
D deixa-nos o melhor para o fim, terminando com "Untitled" e, da mesma forma que abre maravilhosamente bem o álbum, assim o fecha, com esta lullaby song - "Africa". Uma música espiritual, onde D’Angelo celebra um
sentimento de origem e de herança africana ainda que, desfasado geograficamente.
Uma dedicatória ao continente Africano e à sua história.
Pois é… parece que D’Angelo mexe um bocadinho comigo.
E mexe mesmo! Tanto que este ano levou-me a Londres, sozinha, para assistir a um dos seus concertos.
“Ganda maluca” (dizem vocês) - por norma não o sou mas, no que toca à música, não falo por mim. Ela é o meu amor e, talvez
por isso, a minha “extravagância”, o meu “luxo”. É algo em que gosto de
investir pois sei que, à partida, tem a capacidade fantástica de me fazer feliz.
Todavia, quando soube em Dezembro de 2011 que D’Angelo viria em digressão pela Europa, o meu primeiro instinto não foi “Tenho de ir a um concerto dele!!”, foi
antes um “Quem me dera ir a um concerto
dele!!”… Depois, com o passar dos dias, este sentimento foi se enraizando em de mim, ganhando forma e transformando-se numa vontade cada vez maior e concretizável.
Até que chegou um dia em que disse para mim mesma: “Lucélia Fernandes, eu
não acredito que tu vais mesmo a Londres ver o D’Angelo!!”… Já era
tarde demais, a decisão já estava tomada e assim foi.
Infelizmente, não consegui arrastar mais ninguém nesta minha aventura. Como tal, peguei em mim e fui sozinha. Temia pelo facto de ao não poder
partilhar esta experiência com ninguém, a mesma não fosse tão boa quanto esperava.
É verdade e vocês sabem que se há coisa que eu gosto de partilhar nesta vida, é música! No entanto,
esta experiência veio numa fase em que me fazia falta passar um tempo comigo própria,
ter um momento só meu e, realmente, não podia ter sido melhor.
Guardo esta experiência
no fundo do meu coração, com o maior carinho do mundo. Fiquei feliz por ter
ido, adorei, vibrei com cada minuto do concerto e regressei sentindo-me extremamente
em paz e bem comigo própria.
O concerto foi na Brixton Academy. Uma sala emblemática de
Londres onde o R&B é constantemente bem recebido. Não consigo descrever-vos a
atmosfera daquela sala antes, durante e após o concerto… para quem ame soul, R&B e hip hop,
imagine-se no céu. Arrepiante.
D’Angelo é maravilhoso… o seu groove é-lhe, de facto, algo
inerente, orgânico e natural. Algo que, simplesmente, já nasceu com ele. Presenteou-nos com os seus temas
principais e ainda nos apresentou dois novos temas que farão parte do seu tão
esperado 3º álbum.
No dia seguinte ao concerto, aproveitei para passear por Notting Hill e
comprar alguns vinis. Encontrei um vinil do single "Cruisin’", já velhinho, mas ao qual me agarrei com unhas e dentes mal o vi! Perguntei ao vendedor se não tinha mais vinis de D’Angelo, ao que ele me responde que não, pois era difícil encontrar vinis daquele cantor. Quando já
estava a pagar diz-me “Por acaso ele ontem deu um concerto cá, sabia?”…
Sorri… um sorriso tão bom, tão cúmplice… de facto, gostar de música é algo maravilhoso.